quinta-feira, 27 de setembro de 2007

O vício da mentira

Quando as ideias intelectuais são definidas na mente de uma pessoa com base em ódios antigos, ou de estimação, daí só pode advir o erro e a mentira. Estes são os filhos do ódio. Digamos que a tarefa de discernir a verdade é das mais árduas que se depara à mente humana. E irmos para essa batalha intelectual munidos de ódio só pode dar asneira. Porque mesmo que não odiemos, a tarefa não deixa de ser árdua. O ódio só a torna pior...

Carlos Esperança, corifeu do Diário Ateísta, é um desses exemplos de um ateísmo imbuído de ódio, um ódio que derivará de uma ou várias experiências pessoais que lhe moldaram o carácter, e que não tem qualquer interesse discutir aqui. Mas há poucas coisas mais desgraçadas do que deixar que as experiências pessoais nos distorçam o intelecto. Do que permitir que um ou outro episódio pessoal nos destrua o acesso intelectual à verdade.

Esta semana, Carlos Esperança voltou a cair no vício da mentira. Faz-me um bocado confusão, esta forma peculiar de defesa do ateísmo que se vale exclusivamente da demolição da crença usando falsidades. Um ateísmo pela negativa, pela anulação do outro. Como se, para a edificação do ateísmo, fosse suficiente um punhado de cinzas resultantes da queima da crença.

Quando digo que Carlos Esperança é o "regente" do Diário Ateísta, quero com isto dizer que ele não está só nesta forma miserabilista de fazer mau ateísmo usando falsidades. Mas também, de entre os seus colegas de blogue, é ele quem se destaca, porque nele tudo é extremo.

Para ele, os fins (denegrir a fé) justificam plenamente os meios (mentir). É certo que há situações em que devemos mentir, quando está em jogo, por exemplo, salvar a vida a alguém. Quando valores mais altos se levantam, então mentir torna-se numa falta menor. Mas, no caso do Carlos, e de muitos outros no Diário Ateísta, mentir pelo ateísmo é um acto menor, com vista à causa maior.

Não sem alguma pena, assisti ao propagar recente de mais uma confrangedora mentira no Diário Ateísta. Imaginei que, com as devidas correcções, haveria a possibilidade de se repetir o fenómeno do "Juramento Jesuíta", ocorrido há uns dois anos, quando um colega de blogue do Carlos, o João Vasco propagou, sem querer, uma mentira. O João Vasco será uma nobre excepção neste blogue, uma vez que, não deixando de ser ateu, detesta a mentira. Deste modo, quando eu lhe fiz ver que o "Juramento Jesuíta" (baseado num documento forjado que daria conta de um juramento secreto que os noviços teriam que proclamar, jurando matar, espezinhar, queimar e destruir todos os seus inimigos) era uma grossa mentira, João Vasco, imediatamente, se prontificou a escrever um artigo para a corrigir. E fê-lo.

Nobre gesto, que infelizmente, nunca se verifica nem nunca se verificou com Carlos Esperança.
Vamos à questão em concreto. Eis a citação que Esperança atribui ao Papa Leão X (1475-1521):

«A fábula de Cristo é de tal modo lucrativa que seria ingénuo advertir os ignorantes do seu erro»

A princípio, a má fama do seu predecessor Rodrigo Bórgia (Papa Alexandre VI) poderia fazer pensar que Leão X, e se calhar outros Papas daquele período, teria sido também uma pessoa menos recomendável. Confesso que, quando estava em ignorância acerca deste Papa Leão X, até achei plausível que tal frase tivesse saído da sua boca. Lá está: a ignorância a ajudar ao preconceito.

Tendo a perfeita noção de que a infalibilidade papal apenas se aplica a proclamações papais "ex cathedra", também não tremeria na fé se uma asneira destas fosse dita por um Papa. Não é o homem-Papa que é infalível, mas sim o Papa. É o cargo que dá a infalibilidade, e não a virtude da pessoa. Por isso, e isto é suficiente para apontar a futilidade deste esforço de Carlos Esperança, mesmo que a frase fosse historicamente verídica, não colocaria a fé em risco, visto que não se tratava de uma frase "ex cathedra". No entanto, e falo por mim, a falsidade histórica irrita-me. Qualquer uma.

Um rudimentar estudo à vida e obra de Leão X deixa-nos, porém, imediatamente com grandes dúvidas acerca da veracidade da referida citação. E, no entanto, esta citação pulula em míriades de sites ateus, ateístas ou ateízantes (sobretudo nestes últimos). Esta citação também é usada e abusada por alguns "gurus" do New Age como a detestável Acharya S ("The Christ Conspiracy"), considerada ironicamente por um jornalista da nossa praça como uma especialista em espiritualidade...

Mas, afinal, o que é que interessa para uma citação?
O principal interesse de uma citação está no facto de que, sendo verdadeira, se trata de uma frase realmente proferida por uma certa pessoa.

A frase «A fábula de Cristo é de tal modo lucrativa que seria ingénuo advertir os ignorantes do seu erro» só tem interesse como citação, só é uma citação, se o pobre Papa Leão X realmente a proferiu. Ora não há qualquer dado histórico que o permita supor. Pelo contrário, há dados históricos que permitem supor que se trata de uma falsificação que data do tempo da rainha Isabel I de Inglaterra.

Um estudo de James Patrick Holding, bem como o próprio artigo da Catholic Encyclopedia, explica a história com o necessário cuidado, pelo que remeto os detalhes para estes locais. A referência mais antiga a esta falsa citação encontra-se no dramaturgo John Bale (1495-1563), um carmelita que mais tarde abandonou a fé católica para abraçar o protestantismo. Rapidamente, a sua vida e obra foi orientada para a demolição da Igreja Católica. A sua obra para teatro está recheada de pequenas sátiras e misérias escritas com vista à tentativa de destruição moral da Igreja através de propaganda difamatória.

Na sua obra The Paegant of Popes, Bale atribui a tal pseudo-citação ao Papa Leão X. Não estamos a falar de uma referência de historiador, mas sim de um dramaturgo, ainda por cima apóstata e anti-católico.

Assim morre a miserável pseudo-citação. Contudo, não morre, nem morrerá tão cedo, na opinião pública, na "vox populi". Os leitores do Diário Ateísta adoraram a citação, até devem estar desejosos por mais "pérolas" destas. Nenhum daqueles leitores entusiastas está interessado na verdade histórica, só querem mais porcarias destas para atirar à cara dos crentes que virem pela frente. Só para verem a cara do crente quando se lhe diz que um Papa proferiu tal frase. Só pelo deleite de poderem propagar a teoria conspiratória de que a Igreja Católica é uma gigantesca mentira inventada por poucos e aceite irracionalmente por muitos.

Carlos Esperança, quando confrontado com esta mentira, não seguiu a estrada nobre do seu colega de blogue João Vasco: não corrigiu a sua asneira. Ao invés, afirmou que, perante as "mentiras" da Igreja Católica, ele achava que dizia muitas menos. No fundo, para ele, mentir não está mal, desde que se coloquem as mentiras numa balança. Perde quem tiver mais... Um claro exemplo de uma ética deficitária e de um intelecto arruinado.

Assim, esta falsidade da pseudo-citação de Leão X vai parar ao mesmo saco das muitas outras mentiras do Diário Ateísta, de onde já sairam belas pérolas como as do "Papa de Hitler" (que seria Pio XII), a farsa da "Taxa Camarae" (documento espúrio alegando à suposta venda de perdão de pecados por parte da Igreja), ou ainda a teimosa insistência na veracidade histórica da falsificação da Donatio Constantini pela Igreja Católica, conhecida como a "Doação de Constantino" (suposta atribuição, por parte do Imperador, de privilégios e primazia ao Papa).

Mas não se pense que, ao propagar estas mentiras, o Diário Ateísta é original. Sê-lo-á apenas na língua portuguesa, uma vez que o conteúdo costuma ser composto com base na enjoativa repetição das eternas mentiras anti-católicas, já presentes em milhares de sites anti-católicos, e em muitos casos, mentiras com vários séculos de idade...

Mentir é mesmo muito feio...

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