Este tema polémico faz sempre estalar muito verniz. Para responder a algumas contestações que me dirigiram, relativas a existir um suposto "machismo" na minha discordância com o sacerdócio feminino na sua forma cristã, queria deixar-vos com as palavras lúcidas do comentador católico Jean Borella (uma série de artigos dele pode ser encontrada em http://membres.lycos.fr/borellajean/):
"Il n’y a donc pas de disconvenance radicale entre l’essence féminine et le sacerdoce. Il ne peut y a avoir que des disconvenances relatives à la nature particulière, et même unique, du sacerdoce chrétien. Et, bientôt plutôt, faudrait-il affirmer que ces disconvenances relatives ne sont que la contre-partie d’une convenance majeure pour une autre fonction dans l’économie générale du christianisme. C’est donc la nature du sacerdoce chrétien, voulue par le Christ, qui détermine convenance et disconvenance, étant entendu, encore une fois, qu’elles n’ont rien d’arbitraire, et contribuent au contraire à faire de l’homme et de la femme ce qu’ils doivent être pour Dieu. Ainsi, l’abolition de cette distinction quant à l’aptitude des deux sexes au sacerdoce aurait pour effet, non seulement d’altérer (et peut-être même d’anéantir) l’essence véritable du sacerdoce chrétien, mais encore de bouleverser la relation que la femme chrétienne entretient avec l’économie du salut, et par voie de conséquences, à ruiner définitivement l’ordre de la société chrétienne. Car il n’est pas indifférent, pour cette société même, que la distinction des sexes, qui est à la base de toute organisation sociale, se trouve sanctionnée et consacrée par une institution divine, qui, seule, lui donne son véritable sens. A ne reposer que sur des critères biologiques, c’est-à-dire, en dernière analyse, animaux, c’est l’organisation sociale tout entière qui s’en trouve animalisée. Et chacun sait qu’un homme réduit à son animalité est moins qu’une bête. En voulant effacer tous les signes distinctifs entre les deux sexes, les féministes ne se rendent pas compte qu’ils se condamnent nécessairement à subir la dictature de l’ineffaçable distinction physiologique, laquelle, régnant, ne connaît d’autres limites que celles de sa propre satisfaction et ne peut aller qu’à transformer les femmes en pures femelles pour des mâles réduits à la fonction génésique. Telle est la vérité rigoureusement inscrite dans la révolution du « deuxième sexe »." - Jean Borella, "De la Femme et du Sacerdoce".
Ressalvo um pormenor da extrema importância: a minha discordância face ao sacerdócio feminino aplica-se especificamente à sua forma cristã. A leitura cuidada do artigo de Jean Borella permitirá uma compreensão mais profunda deste ponto de vista, que partilho na íntegra com o autor citado (o que não implica, obviamente, a minha concordância com outras suas posições).
Bernardo
"Mas, no íntimo do vosso coração, confessai Cristo como Senhor, sempre dispostos a dar a razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça" - Primeira Carta de São Pedro, cap. 3, vs. 15.
segunda-feira, 30 de agosto de 2004
quinta-feira, 5 de agosto de 2004
O Evangelho de Tomé e o "sagrado feminino"
Todos temos tido contacto recente com leitores do best-seller "O Código Da Vinci", de Dan Brown. Uma das "teorias" avançadas neste romance pouco inocente é o de que os evangelhos apócrifos são mais genuínos que os evangelhos canónicos de Mateus, Marcos, Lucas e João que foram incorporados no cânone do Novo Testamento. Além disto, os adeptos destas "teorias" (que frequentemente não as vêem como "teorias" mas sim como factos) costumam dizer que um importante conjunto destes evangelhos apócrifos, conhecido como "textos de Nag Hammadi" (local no Egipto onde foram descobertos em 1945), ou "evangelhos gnósticos", traz importante informação em relação ao que eles chamam de "sagrado feminino", ou "culto da Deusa", ou seja, que Jesus teria casado com Maria Madalena, e que esta teria sido escolhida para liderar a Igreja após a morte de Jesus. No seguimento desta "teoria", a Igreja Católica (evidentemente "malévola" ao ponto de querer "esconder a verdade") teria feito tudo para a substituir por Pedro, que se asseguraria de que o "culto da Deusa" ficaria sepultado para a posterioridade.
Mas um dos trechos dos evangelhos gnósticos que é menos citado pelos nossos entusiastas do "sagrado feminino" é este trecho do Evangelho de Tomé, que contradiz imediatamente a "teoria" de que o "culto da Deusa" está presente nestes evangelhos:
"Disse-lhes Simão Pedro: que Maria se aparte de nós porque as mulheres não são dignas da Vida. Disse-lhes Jesus: Vede, eu mesmo a guiarei, para fazer dela macho, para que também ela seja um espírito vivo, semelhante a vós machos, pois cada mulher que se tornar macho irá para o reino dos céus." - Evangelho de Tomé, 51:18 (660) a 51:26 (668).
Fonte:
http://www.geocities.com/Athens/9068/log114.htm
(obter primeiro o ficheiro de fonte copta "coptic2.ttf", e colocar este ficheiro em c:\windows\fonts)
Antes de se pronunciarem sobre os evangelhos apócrifos em geral, e sobre os evangelhos gnósticos em particular, e antes de começarem a disparatar sobre os "segredos que a Igreja escondeu", algumas pessoas deveriam começar por se interrogar porque é que a Igreja recusou considerar estes textos como parte integrante do cânone bíblico.
As razões para esta recusa são:
a) razões teológicas, e
b) razões históricas.
Por um lado, o lado teológico, estes textos estão prenhes de heresia gnóstica (não me é possível desenvolver aqui e agora o que é esta heresia e porque é que é uma heresia), por outro lado, pelo lado histórico, estes textos estão temporalmente distantes da vida de Jesus (foram todos compostos a partir do século II d.C, ao contrário dos evangelhos canónicos que pertencem ao século I d.C., sendo S. João o mais tardio e que por vezes é datado até no máximo aos primeiros anos do século II d.C.), e por isso, os factos da vida de Jesus que lá vêm relatados são duvidosos e menos credíveis que os que foram (por essa razão e por outras) incluídos no cânone do Novo Testamento.
O Evangelho de Tomé pertence ao grupo de textos achados no Egipto, em Nag Hammadi, em 1945. Apesar de escritos em cóptico, não se faça confusão! Estes textos não pertencem à Igreja Copta, uma Igreja desde há séculos em cisma com a Igreja Católica, mas que nada tem a ver com a heresia do gnosticismo. Mais ainda, importantes membros e dirigentes da Igreja Copta tiveram um papel fundamental na luta contra as heresias gnósticas. Os evangelhos gnósticos foram muito provavelmente elaborados por seguidores de líderes gnósticos como Valentiniano, nascido em Alexandria por volta do ano 100 d.C. Deverão ter sido escritos em Alexandria ou em comunidades vizinhas. Alexandria foi um importante centro na difusão do gnosticismo.
A minha sugestão para todos os interessados seria:
1. Tentar aceder às fontes directas dos evangelhos apócrifos: há imensos sites na internet com o texto original em cóptico (caso dos textos de Nag Hammadi) e aramaico (caso dos textos de Qumran), e com as devidas transliterações e traduções para inglês;
2. Tentar aceder à documentação da Igreja Católica (textos conciliares, obras patrísticas, compêndios anti-heresia, etc.) para compreender quais foram as razões desta condenação da Igreja aos textos gnósticos, e a homens como Valentiniano.
Bernardo
Mas um dos trechos dos evangelhos gnósticos que é menos citado pelos nossos entusiastas do "sagrado feminino" é este trecho do Evangelho de Tomé, que contradiz imediatamente a "teoria" de que o "culto da Deusa" está presente nestes evangelhos:
"Disse-lhes Simão Pedro: que Maria se aparte de nós porque as mulheres não são dignas da Vida. Disse-lhes Jesus: Vede, eu mesmo a guiarei, para fazer dela macho, para que também ela seja um espírito vivo, semelhante a vós machos, pois cada mulher que se tornar macho irá para o reino dos céus." - Evangelho de Tomé, 51:18 (660) a 51:26 (668).
Fonte:
http://www.geocities.com/Athens/9068/log114.htm
(obter primeiro o ficheiro de fonte copta "coptic2.ttf", e colocar este ficheiro em c:\windows\fonts)
Antes de se pronunciarem sobre os evangelhos apócrifos em geral, e sobre os evangelhos gnósticos em particular, e antes de começarem a disparatar sobre os "segredos que a Igreja escondeu", algumas pessoas deveriam começar por se interrogar porque é que a Igreja recusou considerar estes textos como parte integrante do cânone bíblico.
As razões para esta recusa são:
a) razões teológicas, e
b) razões históricas.
Por um lado, o lado teológico, estes textos estão prenhes de heresia gnóstica (não me é possível desenvolver aqui e agora o que é esta heresia e porque é que é uma heresia), por outro lado, pelo lado histórico, estes textos estão temporalmente distantes da vida de Jesus (foram todos compostos a partir do século II d.C, ao contrário dos evangelhos canónicos que pertencem ao século I d.C., sendo S. João o mais tardio e que por vezes é datado até no máximo aos primeiros anos do século II d.C.), e por isso, os factos da vida de Jesus que lá vêm relatados são duvidosos e menos credíveis que os que foram (por essa razão e por outras) incluídos no cânone do Novo Testamento.
O Evangelho de Tomé pertence ao grupo de textos achados no Egipto, em Nag Hammadi, em 1945. Apesar de escritos em cóptico, não se faça confusão! Estes textos não pertencem à Igreja Copta, uma Igreja desde há séculos em cisma com a Igreja Católica, mas que nada tem a ver com a heresia do gnosticismo. Mais ainda, importantes membros e dirigentes da Igreja Copta tiveram um papel fundamental na luta contra as heresias gnósticas. Os evangelhos gnósticos foram muito provavelmente elaborados por seguidores de líderes gnósticos como Valentiniano, nascido em Alexandria por volta do ano 100 d.C. Deverão ter sido escritos em Alexandria ou em comunidades vizinhas. Alexandria foi um importante centro na difusão do gnosticismo.
A minha sugestão para todos os interessados seria:
1. Tentar aceder às fontes directas dos evangelhos apócrifos: há imensos sites na internet com o texto original em cóptico (caso dos textos de Nag Hammadi) e aramaico (caso dos textos de Qumran), e com as devidas transliterações e traduções para inglês;
2. Tentar aceder à documentação da Igreja Católica (textos conciliares, obras patrísticas, compêndios anti-heresia, etc.) para compreender quais foram as razões desta condenação da Igreja aos textos gnósticos, e a homens como Valentiniano.
Bernardo
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