Sistematicamente, os "media" questionam acerca de um novo Pontífice: será este o Papa que irá abrir o sacerdócio às mulheres? E não poucos católicos, mal informados e sob influência de fazedores de opinião com preponderância mediática, acabam por fazer a mesma questão. Ora a resposta à questão é bastante simples e definitiva: não. A Igreja Católica nunca irá conferir a mulheres nem a ordenação presbiterial nem a ordenação episcopal. Há várias razões para tal, mas nem sempre as temos presentes quando precisamos de explicar a alguém a posição da Igreja Católica nesta matéria.
Eis então as principais razões...
- A razão mais simples é a da autoridade papal: o Papa João Paulo II, na sua Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis sobre a ordenação sacerdotal reservada somente aos homens, datada de 22 de Maio de 1994, deixou bem claro que a resposta é negativa e a questão está encerrada:
"Embora a doutrina sobre a ordenação sacerdotal que deve reservar-se somente aos homens, se mantenha na Tradição constante e universal da Igreja e seja firmemente ensinada pelo Magistério nos documentos mais recentes, todavia actualmente em diversos lugares continua-se a retê-la como discutível, ou atribui-se um valor meramente disciplinar à decisão da Igreja de não admitir as mulheres à ordenação sacerdotal.Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja." - Qual o carácter autoritário desta Carta Apostólica do Papa João Paulo II?
- A Congregação para a Doutrina da Fé respondeu a esta questão, assinando o Prefeito Joseph Cardeal Ratzinger e aprovando a resposta o Papa João Paulo II a a 28 de Outubro de 1995:
- "Dúvida: Se a doutrina, segundo a qual a Igreja não tem faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, proposta como definitiva na Carta Apostólica «Ordinatio sacerdotalis», deve ser considerada pertencente ao depósito da fé.Resposta: Afirmativa.Esta doutrina exige um assentimento definitivo, já que, fundada na Palavra de Deus escrita e constantemente conservada e aplicada na Tradição da Igreja desde o início, é proposta infalivelmente pelo magistério ordinário e universal (cf. Conc. Vaticano II, Const. dogm. Lumen gentium, 25, 2). Portanto, nas presentes circunstâncias, o Sumo Pontífice, no exercício de seu ministério próprio de confirmar os irmãos (cf. Lc. 22, 32), propôs a mesma doutrina, com uma declaração formal, afirmando explicitamente o que deve ser mantido sempre, em todas as partes e por todos os fiéis, enquanto pertencente ao depósito da fé."
- Ver ainda as reflexões da Congregação para a Doutrina da Fé a respeito desta resposta.
- A Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis faz referência a um documento magisterial anterior, a Declaração Inter Insigniores sobre a questão da admissão das mulheres ao sacerdócio ministerial, um documento da Congregação para a Doutrina da Fé, assinado pelo Prefeito Franjo Cardeal Šeper, e aprovado e promulgado a 15 de Outubro de 1976 pelo Papa Paulo VI; este documento respondia às discussões sobre este tema que surgiram ao longo dos anos setenta na sequência da mudança de posição da Igreja Anglicana, que passou a permitir a ordenação sacerdotal feminina; a Declaração Inter Insigniores é bastante mais detalhada do que a Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis, e é dela que retiramos as seguintes razões, não exaustivas, para negar às mulheres a ordenação ao sacerdócio ministerial:
- O facto da Tradição:
- A Igreja Católica nunca admitiu a ordenação de mulheres;
- Quando nos primeiros séculos de cristianismo certas seitas gnósticas procuraram ordenar mulheres, os Padres da Igreja opuseram-se veementemente (Ireneu, Tertuliano, Firmiliano de Cesareia, Cipriano, Orígenes, Epifânio);
- A Igreja Ortodoxa, que todavia permite a ordenação de homens casados ao sacerdócio presbiterial, nunca admitiu mulheres ao sacerdócio;
- A atitude de Cristo:
- "Jesus Cristo não chamou mulher alguma para fazer parte do grupo dos Doze. Se Ele agia desse modo, não era para se conformar com os usos da época, porque a atitude de Jesus em relação às mulheres contrasta singularmente com aquela que existia no seu meio ambiente e assinala uma ruptura voluntária e corajosa";
- Jesus era acompanhado por várias mulheres que faziam parte do grupo de Seus seguidores, mas não admitiu nenhuma ao grupo dos Doze;
- A Declaração Inter Insigniores lista vários exemplos que mostram que a atitude de Jesus não se deixou determinar pela cultura da época e pela forma como esta via a mulher;
- Maria, mãe de Cristo, foi preservada de todo o pecado, e exceptuando o próprio Jesus Cristo, é o único ser humano a quem a Igreja Católica reconhece tal isenção de pecado: e mesmo assim, Maria não fazia parte dos Doze;
- Pelo referido, não é possível afirmar que a exclusão das mulheres do sacerdócio por parte de Jesus Cristo se deva a uma ideia negativa acerca da mulher;
- A prática dos Apóstolos:
- Após a Ascenção de Cristo, estando o grupo dos Apóstolos reduzido a onze pela traição e suicídio de Judas Iscariotes, e tendo a possibilidade de escolher Maria para o lugar de Judas, pelo contrário escolheram um homem, Matias;
- Quando os judeus seguidores de Cristo se confrontaram com o dilema de abandonar certas práticas e tradições judaicas, e várias foram abandonadas, poderiam ter adoptado a ordenação sacerdotal de mulheres, mas não o fizeram, certamente porque viram nessa atitude uma obediência à vontade de Cristo; afinal de contas, os gregos convertidos ao cristianismo não foram considerados como estando obrigados a certos preceitos, como a circuncisão: se a cultura grega aceitava sacerdotizas, e se isso fosse uma questão menor, porque razão não teriam surgido sacerdotizas cristãs nas primeiras comunidades?
- São Paulo nas suas cartas, e os Actos dos Apóstolos, referem várias mulheres importantes no cristianismo dos primeiros tempos, como Lídia, Priscila ou Febe, e nenhuma delas foi ordenada;
- A única explicação para a prática dos Apóstolos está na obediência à vontade de Cristo;
- Valor permanente da atitude de Jesus e dos Apóstolos:
- A ordenação sacerdotal é um sacramento: enquanto que a Igreja Católica sempre teve o poder de modificar o que entendesse acerca da forma de administrar os sacramentos, ela nunca teve o poder de modificar a substância dos sacramentos;
- "(...) a Igreja não tem poder algum sobre a substância dos Sacramentos, quer dizer, sobre tudo aquilo que Cristo Senhor, conforme o testemunho das fontes da Revelação, quis que fosse mantido no sinal sacramental", refere o Papa Pio XII na Constituição Apostólica Sacramentum Ordinis, citando o primeiro cânone da sétima sessão do Concílio de Trento;
- "(...) na Igreja sempre existiu este poder, quanto à administração dos Sacramentos: que, mantendo inalterada a substância destes, ela possa prescrever e modificar tudo aquilo que julgar conveniente, ou para a utilidade daqueles que os recebem, ou para o respeito devido aos mesmos Sacramentos, conforme variarem as circunstâncias, os tempos e os lugares", citação do segundo capítulo da vigésima primeira sessão do Concílio de Trento;
- O sacerdócio ministerial à luz do Mistério de Cristo:
- "O ensino constante da Igreja (...) proclama que o Bispo ou o Presbítero, no exercício do seu ministério, não age em seu nome próprio, «in persona propria»: ele representa Cristo, o qual age através dele: «o sacerdote faz realmente as vezes de Cristo» (...) . Tal valor de representação atinge a sua expressão mais alta e uma forma muito particular na celebração da Eucaristia, que é a fonte e o centro da unidade da Igreja, convívio sacrifical no qual o Povo de Deus é associado ao sacrifício de Cristo: o sacerdote, que é o único que tem o poder de o realizar, age então não somente em virtude da eficácia que Cristo lhe confere, mas «in persona Christi», fazendo o papel de Cristo, até ao ponto de ser a sua própria imagem, quando pronuncia as palavras da consagração";
- "O sacerdócio cristão, portanto, é de natureza sacramental: o sacerdote é um sinal cuja eficácia sobrenatural lhe advém da Ordenação recebida; mas um sinal que deve ser perceptível e que os fiéis devem poder reconhecer sem dificuldade. A economia sacramental, efectivamente, está baseada em sinais naturais, em símbolos inscritos na psicologia humana: «os sinais sacramentais, diz Santo Tomás de Aquino, representam aquilo que eles significam por uma semelhança natural». Esta mesma lei da semelhança natural tem valor tanto para as pessoas como para as coisas: quando se torna necessário traduzir na prática sacramentalmente o papel de Cristo na Eucaristia, não existiria uma tal «semelhança natural», que deve existir entre Cristo e o seu ministro, se a função de Cristo não fosse desempenhada por um homem: caso contrário, dificilmente se veria no mesmo ministro a imagem de Cristo. Com efeito, o próprio Cristo foi e continua a ser um homem";
- "Deste modo, uma vez que o sacerdote representa também a Igreja, não haverá a possibilidade de pensar que esta representação poderia ser assegurada por uma mulher, conforme o simbolismo já exposto? É verdade que o sacerdote representa a Igreja, que é o Corpo de Cristo. No entanto, se ele o faz, é precisamente porque em primeiro lugar representa o próprio Cristo, que é Cabeça e o Pastor da Igreja, na formula usada pelo II Concílio do Vaticano, que explica ulteriormente e completa a expressão «in persona Christi». É nesta qualidade que o sacerdote preside à assembleia cristã e celebra o sacrifício eucarístico «que a Igreja inteira oferece e no qual ela mesma se oferece toda inteira a si própria»";
- O sacerdócio ministerial no Mistério da Igreja:
- "Assim, tem de ser bem acentuado quanto a Igreja é uma sociedade diferente das outras sociedades, original pela sua natureza e pelas suas estruturas. A função pastoral na mesma Igreja, anda normalmente ligada ao sacramento da Ordem: esta função não é um simples acto de governar, comparável à maneira de exercitar a autoridade que se verifica nos Estados. É algo que não é outorgado apenas por uma escolha espontânea dos homens: ainda mesmo quando o conferir tal função comporta uma designação por via de eleição, é a imposição das mãos e a oração dos sucessores dos Apóstolos que garantem a escolha da parte de Deus; é o Espírito Santo, dado pela Ordenação, que faz com que alguém participe do poder de reger do Supremo Pastor, Cristo (cfr. Act. 20, 28). A função pastoral é serviço e amor: « se tu me amas, apascenta as minhas ovelhas » (cfr. Jo. 21, 15-17).
- "Por esta razão, não se vê como seja possível o propôr o acesso das mulheres ao sacerdócio, em virtude da igualdade dos direitos da pessoa humana, igualdade que conserva todo o seu valor também para os cristãos. Para tal fim, faz-se uso por vezes daquele texto citado em precedência da Epístola aos Gálatas (3, 28), segundo o qual, em Cristo, já não haveria distinção entre o homem e a mulher. Essa passagem, porém, não se refere de maneira alguma aos ministérios; nela, afirma-se simplesmente a vocação universal para a filiação divina, que é a mesma para todos."
- "Além disso e sobretudo, seria desconhecer completamente a natureza do sacerdócio ministerial o considerá-lo como um direito: o Baptismo não confere título algum pessoal para o ministério público na Igreja. O sacerdócio não é conferido para honra ou para simples vantagem daquele que o recebe; mas sim, para ser um serviço a Deus e à Igreja; ele constitui o objecto de uma vocação específica, totalmente gratuita: « Não fostes vós que me escolhestes a mim; fui eu que vos escolhi a vós e vos constituí... » (Jo. 15, 16; cfr. Hebr. 5, 4)."
- "As mulheres que formulam a sua petição em ordem ao sacerdócio ministerial são com certeza inspiradas pelo desejo de servir a Cristo e à Igreja. E não é de estranhar que num momento em que as mulheres tomam consciência das discriminações de que foram objecto, elas cheguem a desejar o próprio sacerdócio ministerial. Mas é preciso não esquecer nunca que o sacerdócio não faz parte dos direitos da pessoa; é sim algo que depende da economia do mistério de Cristo e da Igreja. O múnus sacerdotal não pode tornar-se a meta de uma promoção social; nenhum progresso puramente humano da sociedade ou da pessoa poderá, por si mesmo, dar o direito de acesso ao sacerdócio: este é qualquer coisa de uma ordem diversa."
9 comentários:
A Igreja Ortodoxa permita o casamento dos presbíteros ou a ordenação de homens casados?
É diferente!
Sei que, pelo menos nas Igrejas Católicas orientais o permitido é a ordenação de homens casados.
Se um homem é ordenado solteiro deve manter-se solteiro.
Ah, Nuno, sempre atento! ;)
Obrigado. Tens toda a razão. Vou rectificar.
Por favor, se vires mais gralhas avisa este teu amigo.
Um abraço
Bernardo
Já está corrigido!
A sua exposição é esmagadora e seria estultícia minha tentar sequer rebatê-la. Falta-me tudo para o poder fazer. Mas, por vezes, um espírito simples e despojado de algum saber teológico e intelectual, pode lançar alguma luz sobre enredados desta natureza. É que, desculpe dizer-lho, parece-me esta discussão igual à outra bizantina de saber qual o sexo dos anjos. Aqui também me pareceu ver o Bernado preocupado com o género sexual de Cristo. É que, sinceramente, em nenhum dos seus argumentos vi, um único que fosse, indicador claro de não poderem ser as mulheres ordenadas. Que Cristo não escolheu nenhuma, sabemos. E daí? Que é um sacramento, sabemos, e daí? (as mulheres recebem-nos todos, menos um) Que não é um direito de ninguém, sabemos, e daí? Que o sacerdote representa Cristo, sabemos, e daí? Ou é a questão de Cristo, quando homem na Terra, era macho? Cá está a discussão do sexo dos anjos. Mas afinal, o homem e a mulher não são uma só criatura aos olhos de Deus? E Cristo é homem ou mulher? Então os anjos e Deus têm género sexual? Para quê? Pois se Deus criou... não se reproduziu.
E daí?
E daí que a igreja considere que não tem o poder de ordenar mulheres (por muito que isso incomode os que se opõem e os que não pertencem à igreja).
Vasco Gama
A mim incomodam-me muitas coisas. A ordenação das mulheres é das que menos me incomoda. Não me oponho a coisa nenhum simplesmente tento entender, e julgo, como baptizado, que pertenço à Igreja.
Se a Igreja considera que não tem o poder de ordenar mulheres, é justo que tente compreender porque não tem tal poder ou porque julga não o ter. Foi só isso que quis dizer. Julgo que os argumentos que o Bernardo usou (que eu leio atentamente por considerar que me ensina e tem muito para me ensinar) não são suficientemente esclarecedores para essa atitude. Foi só.
Caro João Alves,
Agradeço o seu comentário, de forma injusta, pensei que se tratasse de um não crente.
A mim, há muita coisas que dizem respeito à Igreja Católica que não entendo inteiramente. Mas, quanto às minhas dúvidas e inquietações opto por dar o benefício da dúvida à própria Igreja e não aos que estão fora ou se opõem e ela (por me parecer pouco razoável). Esta é a minha posição e não quero sugerir que a sua esteja errada, essa será uma escolha sua (que eu respeito).
Os meus cumprimentos
Falou muito, mas não deu nenhum argumento convincente de que a ordenação de mulheres não seja legítima, a não ser por uma perspectiva de inferioridade da mulher em relação ao homem, que segundo à visão exposta não é digna de exercer o sacerdócio.
Quando diz "mulher alguma" demonstra um certo desprezo pela figura da mulher, poderia dizer "nenhuma santa e digna mulher", dessa forma estaria mais aproximado do valor que a mulher possui. Que, raríssimos homens aproximam, pois só as mulheres trazem outra vida dentro de si, e só elas possuem o amor de mãe, aquele que mais se aproxima do amor de Deus. Por isso para falar de uma mulher digna precisa fazer reverência e ter muito respeito.
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