segunda-feira, 10 de novembro de 2003

Os dois problemas fundamentais da epistemologia

A epistemologia, para os mais distraídos, estuda o conhecimento científico. É um ramo essencial do conhecimento na medida em que serve de regulador e de observador crítico ao trabalho das ciências.
Segundo Karl Popper, os dois problemas fundamentais da epistemologia são a indução e a demarcação entre ciência e metafísica.

Hoje interessa-me falar sobretudo do segundo.
É certo que o que é entendido hoje por metafísica, que significa literalmente "o que está para além da física", difere muito do sentido que lhe dava, por exemplo, Aristóteles. Sucede o mesmo com o conceito de "física", hoje em dia convertido num ramo muito específico do conhecimento. Por isso, a leitura dos filósofos e epistemólogos modernos pode ser, por vezes, desconcertante devido à estreiteza da linguagem como ferramenta de comunicação (principalmente para tratar temas como a metafísica) e à alteração do significado dos conceitos ocorrida ao longo da História.

Karl Popper agrada-me, sobretudo, pela sua análise fortemente crítica. Para Popper, uma questão fundamental é a separação dos dois domínios. Ele recusou duas teorias de demarcação que tinham sido avançadas antes:

a) a demarcação pela "base observacional"; ou seja, tudo o que não fosse observável estaria fora das ciências empíricas e pertenceria ao domínio da metafísica
b) a demarcação pelo uso do método indutivo; ou seja, tudo o que não seguisse métodos indutivos pertenceria ao domínio da metafísica.

Popper apontou, e bem, as falhas destas teorias de demarcação. Existe um imenso conjunto de teorias abstratas e altamente especulativas, por exemplo, na física moderna através de Einstein. Por isso, cai por terra a demarcação pela "base observacional". O segundo critério de demarcação é também facilmente refutado pela constatação de que, fora da ciência, existem numerosos exemplos do uso do método indutivo. Popper exemplifica com a Astrologia, que ele classificou de "pseudo-ciência".

Como demarcar então conhecimento científico e conhecimento metafísico?
Popper sugere a "refutabilidade ou falsificabilidade de um sistema teórico".

Assim, apesar de Popper não se interessar por metafísica, o que deriva da sua inclinação ou gosto pessoais, pelo menos não foge da necessidade de imposição de uma demarcação. Fica por discutir se a opinião de Popper em relação à metafísica era tão depreciativa como a de muitos colegas seus. Depreciar a metafísica é depreciar o superior em detrimento do inferior. A própria etimologia da palavra "metafísica" é suficiente para o demonstrar cabalmente.

Bernardo

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