Este artigo de René Guénon foi publicado inicialmente na revista Regnabit em Junho de 1926. Foi incorporado mais tarde na resenha póstuma "Symboles de la Science Sacrée".
Visto que a obra de Guénon está protegida por copyright até ao ano 2021 pelo menos (facto que Guénon certamente detestaria!), vimo-nos obrigados a apresentar apenas traduções de pequenos excertos do artigo. Convidamos o leitor interessado a adquirir a obra referida, que consideramos ser de grande utilidade.
A tradução do francês para português é feita por mim, e é, por essa razão, de carácter amador. As minhas desculpas prévias pelas eventuais incorrecções.
«A civilização moderna aparece na história como uma verdadeira anomalia: de todas as que conhecemos, ela é a única que se desenvolveu num sentido puramente material, a única também que não se apoia em nenhum princípio de ordem superior. Este desenvolvimento material que se desenrola há vários séculos, e que se acelera cada vez mais, foi acompanhado de uma regressão intelectual que ele é incapaz de compensar. Trata-se, bem entendido, da verdadeira e pura intelectualidade, que também poderiamos chamar de espiritualidade, sendo que nos recusamos a dar este nome àquilo que os modernos se têm sobretudo aplicado: a cultura das ciências experimentais, com vista a aplicações práticas às quais elas são susceptíveis de dar lugar. Um só exemplo poderia permitir medir a extensão desta regressão: a Summa Theologica de S. Tomás de Aquino era, no seu tempo, um manual para o uso de estudantes; onde estão hoje os estudantes que seriam capazes de a aprofundar e de a assimilar?».
«Um Oriental não pode admitir uma organização social que não repouse em princípios tradicionais; para um muçulmano, por exemplo, a legislação inteira não é senão uma dependência da religião. Em tempos, também assim foi no Ocidente: basta lembramo-nos do que foi a Cristandade na Idade Média; mas, hoje, as relações estão invertidas. Com efeito, vemos agora a religião como um simples facto social; em vez da ordem social inteira ser associada à religião, esta contrariamente, quando ainda consentimos dar-lhe um lugar, não é mais vista senão como um qualquer dos elementos que constituem a ordem social; e quantos católicos aceitam esta forma de ver sem a menor dificuldade!»
«Praticamente, crentes e não crentes comportam-se quase da mesma maneira; para muitos católicos, a afirmação do sobrenatural não tem senão um valor teórico, e ficariam embaraçados se tivessem que constatar um facto miraculoso. É o que podemos chamar de um materialismo prático, um materialismo de facto; não é este mais perigoso do que o materialismo admitido, precisamente porque aqueles que por ele são atingidos não têm sequer consciência?»
«Seria contudo bem fácil demonstrar que a religião e a ciência não podem entrar realmente em conflito, pela simples razão de que elas não pertencem ao mesmo domínio. Como não ver o perigo que há em parecer procurar, para a doutrina que diz respeito às verdades imutáveis e eternas, um ponto de apoio no que há de mais variante e incerto?
E que pensar de certos teólogos cristãos que estão afectados do espírito "cientista" ao ponto de se crerem obrigados a ter em conta, em maior ou menor medida, os resultados da exegese moderna e da "crítica dos textos", quando seria fácil, na condição de ter uma base doutrinal um pouco segura, fazer aparecer a sua inanidade? Como não nos apercebermos que a pretensa "ciência das religiões", tal qual ela é ensinada nos meios universitários, jamais foi na realidade outra coisa do que uma máquina de guerra dirigida contra a religião, ou de forma mais geral, contra tudo o que ainda possa subsistir do espírito tradicional, que querem naturalmente destruir aqueles que dirigem o mundo moderno num sentido que só pode terminar numa catástrofe?»
Não posso senão recomendar a leitura do artigo na íntegra e na língua original, visto que apenas apresentei alguns excertos do mesmo.
Bernardo
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