quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

A «palhaçada» do aborto livre e legal

O título deste texto não tenciona fazer qualquer ataque à nobre arte circense, mas sim usar uma expressão corriqueira para manifestar o meu profundo nojo (intelectual e sensorial) perante o evoluir bem previsível, e em tão pouco tempo, desta triste situação.

«Ontem, o líder parlamentar socialista, Alberto Martins, que chamou a si a questão, garantiu que o diploma não deverá aconselhamento obrigatório da mulher que pretende abortar – uma afirmação que foi contestada pelos movimentos que se bateram pelo “não” no referendo. Por outro lado, a lei deverá contemplar um período de reflexão de alguns dias, após a consulta médica inicial, de contornos também ainda não definidos.» - in Público, 14 de Fevereiro de 2007.

Continua a manipulação das palavras.... "Aconselhamento obrigatório" transmite, emocionalmente, a mesma sensação da expressão "prisão das mulheres", mesmo sem mulheres presas...
O PS, naturalmente, não está nada disponível para leis sensatas, nunca esteve, e se o Eng. José Sócrates o tentou sugerir com belas palavras na noite da vitória de triste memória, fê-lo claramente no melhor espírito de teatro político, do qual ele é mestre exímio.

Do mesmo modo que o Eng. Sócrates não via nem vê uma mulher que comete o crime de aborto como "criminosa", também não achará correcto "impor" a essa mulher o aconselhamento prévio, uma quase vil forma de "prisão psicológica", pensará ele e os seus correlegionários.

O regime anárquico de abolição do crime de aborto só pode ser seguido (em lógica e coerência) pelo regime libertário: deixem as mulheres abortar em paz!
Certo? Certo...

Na origem de tudo isto, não me tenho cansado de insistir, está uma dramática anomalia intelectual tripartida:

a) não ver a vida intra-uterina como plenamente humana, com direito a viver
b) não reconhecer a obrigatoriedade do estado em garantir a Justiça, por meio da protecção de direitos fundamentais
c) não criminalizar as condutas que atentam contra direitos fundamentais

Faltando estes três pontos, tudo cai por terra. O aborto torna-se num "direito reprodutivo". E, claro está, do mesmo modo que ninguém se lembra de impor consultas de métodos contraceptivos a ninguém, e porque o PS vê o aborto exactamente como contracepção, é natural que não queira impor às mulheres a consulta obrigatória, que seria a derradeira oportunidade para se fazer ver à mulher que planeia abortar os terríveis males físicos e psíquicos do aborto.
Ficamos, então, com a sugestão vaga feita às mulheres de que façam, onde quiserem, a sua experiência pessoal e individual de "gabinete de reflexão"...
Terá uma eficácia potente, como aquela do imperioso dia de reflexão pré-votação.
Seguramente que esta "reflexão" não será feita no conforto das salas arejadas das modernas clínicas das Yolandas Hernandez Dominguez desta vida. Era só o que mais faltava! Para quem faz da morte um negócio, faz algum sentido criar um serviço de aconselhamento prévio? Seria como um centro comercial ter à porta um gabinete a recomendar às pessoas que não comprem nada naquele espaço...

Quando a questão é, realmente, de vida ou de morte (vida da mãe, vida do feto), dá uma enorme tristeza ter que dizer "eu tinha razão", ou ter que relembrar o que eu disse, afirmando que votar SIM era uma grave asneira de graves consequências... Que era um cheque em branco para políticos incompetentes, ignorantes, desprovidos de um intelecto funcional, e ainda por cima ideologicamente comprometidos numa guerra cultural.
Estamos ainda nas primícias da degradação ética e moral à qual ainda vamos todos assistir no nosso tempo de vida.
A partir daqui é sempre a descer...

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